Quando eu fazia a antiga 2ª série do 1º grau, num dia comum
de aula, minha professora, que hoje infelizmente já não lembro mais o nome, fez
um teste simples conosco. Ela aproximava-se de cada aluno e com uma colher de
sopa tampava um dos nossos olhos e pedia que lêssemos algo que estava escrito
no quadro. Com esta simples ação, ela descobriu que alguns de nós tínhamos
alguma deficiência na visão. Ela chamava os nossos pais e solicitava que eles
nos levassem ao, naquela época, chamado “oculista”.
Minha primeira vez no “oculista” foi uma experiência
extraordinária. Até então eu via com meus olhos e entendia que aquela maneira
era a melhor, era o máximo que eu podia alcançar, mas quando o Dr. Oculista me
pediu que sentasse naquela cadeira oftalmológica puxou aquele grande
equipamento com várias lentes e colocou sobre os meus olhos, algo mudou.
No primeiro momento ficou tudo mais embaçado, mas depois ele
movia as lentes para frente e para trás e me dizia: Fica melhor assim, ou
assim? O barulho do movimento das lentes era intenso e voltava a pergunta: Fica
melhor assim, ou assim? E de novo o movimento se repetia e eu encantada queria
que ele chegasse naquele conjunto de lentes que me faziam ler até as minúsculas
letrinhas que eram projetadas na parede branca.
Depois deste momento extraordinário chegou a hora de
escolher os óculos. Naquela idade era algo muito legal e a possibilidade de ver
mais me fez ser parceira deles durantes muitos anos, até que depois de insistir
muito, na adolescência, convenci minha mãe e me comprar um par de lentes.
Não foi uma boa experiência, não me adaptei a elas. É
interessante, como nem sempre nos adaptamos a algumas formas de ver. Até que
aos 26 anos eu fiz a maravilhosa cirurgia a laser para correção visual. Já não
suportava mais os óculos, muito menos as lentes e precisa ver melhor.
Passados os três primeiros dias, ao conseguir abrir com
tranquilidade os olhos, aí sim, vi um novo mundo. Os detalhes das folhas, o azul do céu, o grão
de arroz no prato, as bolinhas subindo no copo de champanhe, os detalhes da
íris dos olhos dos meus amigos. Era incrível, como eu enxergava como nunca
tinha conseguido antes. Era perfeito.
E enxergar mais alimentava não só a minha mente, mas a minha
alma. Enxergar mais me fazia ver coisas que não tinha visto antes. Fazia-me
questionar o que até então eu julgava como único. Não foi só a minha visão
mudou, mas a forma como eu aceitava o mundo.
Nossa forma de ver tem relação com o paradigma que temos de
vida. E às vezes é preciso regular as lentes dos óculos, tentar lentes novas ou
até corrigir de forma mais invasiva aquilo que parece estar embaçado, parece
estar incompleto, parece estar incomodando e teimamos em não reagir e
continuar, mesmo infelizes, naquela situação.
Por muito tempo nos acostumamos com a mesma vista e
limitamos a nossa mente aquele cenário, limitamos a nossa mente aqueles
aprendizados, limitamos nosso ângulo de visão e não nos permitimos ampliar.
Regular sua visão pode regular sua trajetória, pode
despertar seus talentos, pode transformar seu futuro. Você pode ver além das
montanhas, mas para isso é preciso algum esforço.
Até acho, que antes do esforço é preciso permitir-se
questionar o momento, ver de fato, olhar, enxergar...
As vezes rejeitamos o novo, sem mesmo entende-lo. Rejeitamos o novo por medo das decisões que
teremos que tomar. Para começar a usar os óculos eu precisei do apoio da minha
professora e da minha mãe. Mas com o tempo, eu fui capaz de ir tomando as
minhas próprias decisões. Regular sua visão pode regular o destino que você
deseja trilhar.
Marta Andrade
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